Modos de Ver
O primeiro episódio do documentário 'Modos de Ver', de John Berger, tem o propósito de despertar no espectador a consciência de como são vistas atualmente as pinturas europeias clássicas. Ele reforça muito a relação da pintura com seu entorno, com o que antecede e com o que sucede a visualização da obra. Ou seja, o contexto no qual o quadro é apresentado pode mudar a interpretação dele em nossa mente. Ás vezes, uma pintura grandiosa pode passar despercebida pelo nosso olhar, por exemplo, enquanto folheamos uma revista repleta de publicidades e outras imagens. É possível também olhar apenas recortes de uma pintura, sem ter todo o conjunto para se formar a imagem.
Entretanto, será que essa diversificação das pinturas é negativa? Falo no sentido de, com o passar do tempo, outras artes visuais foram desenvolvidas, artes essas que se adequam bem a essas cópias e movimentos, como o cinema e a fotografia. A fotografia, muitas vezes, está atrelada com a ideia de reprodução em larga escala (cartões postais, por exemplo). O cinema "obriga" o telespectador a ficar um tempo específico dedicado a assistir à obra, e dentro desse período pode ambientar a assistência para ocasionar sentimentos específicos. A pintura não tem esses fatores, como John mesmo fala, ela é estática, e foi feita para ser vista em um silêncio, em volta de uma moldura. Tendo isso posto, o que as pessoas fazem, ao cortar, enquadrar, apresentar as pinturas de uma forma diferente ao público é realmente negativo? A arte transcende o artista, e a interpretação do mesmo não é, de forma nenhuma, a única válida. Qual é de fato o problema em divulgar a arte em diferentes formas? Vemos muito isso na música, com os samples, trechos que vão fazer parte de outras composições.
Outro fator, apresentado no final do episódio me chamou atenção, a mistificação. John não detalha muito sobre o que de fato é essa mistificação, mas tem relação com a capacidade de interpretar diretamente uma obra. Eu acredito que um artista tenha consciência disso na hora de fazer sua arte, ele escolhe um caminho a seguir, e que leva a uma interpretação preferencial. A impressão que tenho é que a crítica de arte contribui muito para esse afastamento da obra com relação ao espectador (especialmente quando se trata dessas pinturas barrocas europeias). Por que a comunidade artística faz isso? Eu sei que isso tem uma relação com essa mistificação, mas não sei dizer muito bem qual é.
Essas pinturas mostradas no vídeos são, para mim, grandes referências do que é o cânone na arte. Parece que os artistas depois do renascimento e do barroco nunca serão capazes de superar essas obras (por mais que algumas obras mais recentes sejam tão ou mais excepcionais). Não falo somente da pintura, a escultura, a escrita, etc. não carregam essa 'grandiosidade' quando são faladas e estudas - pelo menos é essa a impressão que me foi passada durante a escola. Será que ao valorizar de forma mais uniforme todas as formas de arte não seja um caminho para que as pessoas passem a interpretar as pinturas apenas por suas imagens, sem juízo de valor?
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